Um pacote reembrulhado de concessões

O Governo Temer lançou ontem o seu pacote de concessões, prometendo substanciais mudanças, para atrair os investimentos privados, mas mantendo a essência das condições que levaram os empreendimentos ao fracasso nos Governos anteriores.

Duas são as condições inadequadas que persistem no "pacote": são empreendimentos isolados e não sustentados por um planejamento estratégico nacional. Seriam boas oportunidades de investimentos, segundo a perspectiva privada.

Em segundo lugar o objetivo principal é o levantamento de recursos para o Governo e não a melhoria da infraestrutura.

São duas categorias distintas dos empreendimentos incluídas no pacote: os "greenfield" e os "brownfield".

Os brownfields já tem investimentos feitos. O concessionário investe um valor adicional, presta serviços totais, com o custo de amortização baixo. O interesse privado é de pagar o menos possível pelo investimento já feito, fazer o menor investimento complementar e faturar sobre o todo. A base do negócio está em comprar barato os ativos pré-existentes em função da crise.

Dada a necessidade de "fazer caixa" para cobrir o rombo do Tesouro, o Governo pretende "vender" os ativos pré-existentes a "qualquer preço". E tem a ilusão de que os chineses estão dispostos tal. Na ilusão de que o melhor negócio do mundo, atualmente é "negócio do Brasil", contrapondo-se ao antigo "negócio da China". Coisa barata n no mundo são ativos brasileiros.

O risco das liquidações é que se compra barato o que depois não tem uso.

As concessões na infraestrutura não são - primordialmente - de investimentos, mas de prestação de serviços a longo prazo, a qual deve ser operacionalmente rentável, gerando margem suficiente para amortizar os investimentos. Nesse sentido a condição fundamental para um bom investimento num empreendimento de infraestrutura é o quanto o serviço vai render, como resultado líquido. Esse define a viabilidade econômica.

Como os investimentos precisam ser feitos antes e a sua amortização econômica deverá ser feita ao longo de todo o período da concessão, há necessidade de financiamento para dar suporte aqueles investimentos prévios. Diante de casos concretos o empreendedor privado interessado irá estuda a necessidade do aporte inicial em ativos - caracterizado como capex (capital expenditure) e os resultados do opex (operational expenditure) e o balanceamento entre as necessidades financeiras e os resultados econômicos.

Os prazos de financiamento nem sempre coincidem com os prazos de amortização do investimento, o que significa que o empreendedor terá que colocar capital próprio para cobrir o opex, depois de vencidos os prazos de amortização dos financiamentos.

Já nos projetos "greenfield" o investimento necessário será total, não havendo a oportunidade de assumir - a baixo custo - os ativos pré-existentes. Não há a vantagem de faturar de imediato, sem necessidade de pagar os eventuais financiamentos para a construção desses ativos.

Usando um exemplo moderno, um empreendedor poderá adquirir um veículo já adaptado para funcionar como "food-truck", a "preço de banana" e financiamento quitado e passar a cuidar apenas da compra de insumos, a preparação e a venda dos alimentos.

A sua visão de negócio será o preço do veiculo, mas se não tiver vocação para a prestação dos serviços não conseguirá produzir alimentos que interessem ao consumidor, venderá menos do que compra, arcando prejuízos operacionais e ai
só terá como opção passar o veículo adiante a um preço menor ainda do que comprou.

São dois momentos distintos de avaliação: o primeiro de interesse em estudar o negócio. O segundo de avaliar o negócio. O Governo é iludido pelo volume de interessados em estudar o negócio. Mas quando chega à fase de avaliação, uma parte desiste. Pode ocorrer que nessa fase não sobre ninguém e as licitações resultem em vazias.

Há empecilhos mais flagrantes e visíveis que precisam ser superados, mas poder avaliar e cuidar do principal: essa é a demanda dos serviços da concessão.

O pacote ora lançado se baseia em suposições ou ilusões sobre a demanda, gerando expectativas que não se efetivarão ou poderão não se efetivar.

Dois casos são emblemáticos: a inclusão da Fiol - Ferrovia de Integração Oeste-Leste baseado no carregamento de minério de ferro, do interior da Bahia até Ilhéus. Onde terá que ser feito um terminal privativo. ´

Há um excesso de aço no mundo. As cotações internacionais do minério continuarão baixas ainda por muito tempo, Como empreendimento estritamente capitalista privado não é viável. Como tal não gera interesse como negócio efetivo, mas sim como uma "construção, do tipo Eike Batista", baseado em ilusões muito bem montadas.

Ou como interesse estratégico de ter uma fonte própria, que seria a base do interesse do Governo chinês. Que comanda o capitalismo estatal. A questão, nesse caso, seria porque a mina da Bamin, no interior da Bahia e não uma mina em Minas Gerais ou mesmo no Pará?

A resposta é simples: o que interessa não é apenas a mina, mas ter o controle de um sistema próprio, por inteiro que não dependa de terceiros para transportar o minério até o porto e também ter o controle sobre a operação portuária.

O modelo seria similar ao que a então Companhia Vale do Rio Doce (atualmente apenas Vale) implantou em Carajás: um sistema integrado sob total controle da companhia.

Os chineses teriam a garantia da demanda. Seriam eles mesmo os compradores. Mas será compensa a eles ter um minério a custos elevados, quando teriam opção de compra do mesmo minério ou de qualidade melhor na Austrália? Ou mesmo em no empreendimento da Fepasa, no Pará?

Em Minas, onde ainda há grande abundância de minério esse modelo seria mais difícil de ser implantado e foi inteiramente comprometido com o desastre da SAMARCO em Mariana.

Mas haveria a possibilidade de aquisição do sistema da Anglo-American, com acesso ao Porto de Açu, também mediante um mineroduto, como o da SAMARCO.

Como "negócio do Brasil" para aproveitar a crise e comprar ativos baratos haveria opção melhores do que investir na FIOL, na direção ao porto de Ilhéus.

Outra questão são as concessões dos aeroportos.

(cont)


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