Não é pelo ralo: é no brejo

A sensação do "bem que avisei" é ambígua. De um lado a satisfação de ter percebido antes. De outro a frustração de não ter sido ouvido ou nada ter feito de concreto, a não ser ter avisado. Ou publicado neste blog, de pequena repercussão.

Desde 2015, mediante um Grupo formando no Instituto de Engenharia, estamos estudando a questão da logística do agronegócio, com foco nas soluções de saída pelo Norte. Prevendo o estrangulamento do escoamento e propondo as estratégias e investimentos para superá-lo. 

Mas não tivemos eco.

(original de 06/03/2017, atualizado em 07/03/2017)

O Ministro da Agricultura, Blairo Maggi, da familia dos maiores produtores de soja do Mato Grosso, alertou - tardiamente - os problemas de escoamento da supersafra, com os atolamentos dos caminhões na BR 163, uma das rotas de saída pelos portos do Norte.
A expressão usada não foi a mais adequada: a safra não está indo pelo ralo: está ficando mesmo no brejo. 

Os problemas logísticos da safra de grãos deveriam já ter ocorrido em 2016, mas a frustração da produção e colheita, causada pelo "La Niña", amenizou a ocorrência. Além de um volume menor, choveu menos e as estradas não pavimentadas do Norte, tiveram menos problemas. 

O Governo ganhou um tempo para melhorar a BR 163 e para ter feita a concessão do Ferrogrão. Mas não aproveitou. É verdade que a Operação Lava-Jato atrapalhou. Porque nas duas obras, a construtora mais provável seria a Odebrecht. Seria um prolongamento do esquema montado pelos governos petistas. 

Além disso, o processo de impeachment de Dilma, o Governo ficou paralisado. 

Já para a safra 2016/2017, que começou a ser plantada no segundo semestre a 2016, não enfrentou os mesmos percalços climáticos. Em todas as previsões de safra feitas pela CONAB - do Ministério da Agricultura - e pelo IBGE, a partir da área plantada e  das estimativas de produtividade, foi prevista uma supersafra que está sendo efetivada. Serão cerca de 215 milhões de toneladas de grãos. Não muito diferentes das previsões da USDA, o órgão americano que faz as previsões mundiais de safras agrícolas.

Dois foram os principais gargalos previstos: as dificuldades de transporte dos grãos por caminhões em estradas de terra, em direção aos portos do Norte, diante da possibilidade de chuvas no início do ano e as prováveis filas de caminhões, nas rodovias de acesso ao Porto de Santos e de Paranaguá. 

O primeiro, infelizmente, já ocorreu. E somente com a sua efetivação, o Governo começou a tomar providências - ainda que paliativas - para mitigar os problemas. 

Em relação ao segundo, uma série providências, diante dos problemas anteriores já foram tomadas, como a criação de áreas de espera, agilização da operação portuária, ampliação do transporte ferroviário. Deverão ocorrer algumas filas, mas não tão graves. 

Os problemas atuais são apenas prenúncios de problemas mais graves que poderão ocorrer nas safras futuras, dentro da previsão de que o Brasil poderá chegar a uma produção da ordem de 400 milhões de toneladas só de grãos, fora outros produtos agrícolas, pecuários e florestal. 

O escoamento das safras não poderá depender apenas dos caminhões e estradas estreitas e mal conservadas. Ou pior: de estradas não pavimentadas. 

O Brasil terá que investir intensamente na melhoria e ampliação da sua rede ferroviária de cargas, podendo aproveitá-la também para passageiros. Essa necessidade não pode ser vista sob o viés romântico da "volta do trem". A ferrovia é a melhor alternativa para garantir o escoamento da safra. Mas para isso precisa ter viabilidade econômica, o que é contraditória com a visão de redução do frete, em relação ao rodoviário. Para ser viável terá que ter um frete próximo ao do rodoviário. Fora disso ficará na dependência de subsídios governamentais, para ser viável. 

O ganho nos custos logísticos estará na maior segurança de chegada dos produtos nos portos, com o menor volume de perdas durante o percurso. 

Ainda que assegurada a viabilidade econômica do empreendimento, será necessário ter a viabilidade financeira, isto é, a obtenção do financiamento para os investimentos e, depois, a geração de recursos e o financiamento do capital de giro para poder cobrir os gastos operacionais e amortizar o capital - incluindo nesta, a amortização dos financiamentos. 

Com a escassez de recursos públicos, nos próximos 20 anos, para poder reequilibrar as contas públicas, os empreendimentos ferroviários, assim como a melhoria da rede rodoviária ficarão inteiramente na dependência de investimentos privados.

Tais investimentos serão de duas origens principais: capital externo, supostamente abundante, e capitais nacionais de setores com excedentes. O principal setor com excedente será o agrícola, desde que consiga ter solução para vencer os gargalos logísticos.

O setor agrícola - que é essencialmente privado - tem investido em componentes importantes da cadeia logística, como terminais portuários e terminais intermediários, todos de caráter privado. Não investem em nas vias rodoviárias ou ferroviárias, por entenderem que esses são obrigação do Estado. 

São obrigações, mas não cumpridas. E quem paga as penas pelo não cumprimento é o próprio setor produtivo agrícola. O resultado é esse que estamos assistindo. As tradings investiram em terminais em Miritituba, no Pará, ponto de transbordo dos grãos oriundos do Mato Grosso, vindo pela Rodovia BR 163, para seguirem de barcaças até Santarém ou Belém. Só que os grãos não tem chegado aos seus terminais, atolados na lama e nos buracos da BR 163. 

Essa situação vai continuar nesta safra e se repetir nas próximas. 

O setor de grãos agrícolas, pelos seus produtores e comercializadores terão que vencer os preconceitos e investir nas rodovias e ferrovias. Participando das concessões, direta ou indiretamente.

Ou eles investem nos empreendimentos logísticos concedidos ou ficarão com as suas safras "apodrecendo" nas fazendas.  Sem condições de chegarem aos portos. 







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