Globalização e latinoamericanização

É senso comum, repetido diversas vezes pela mídia, que a economia se globalizou e o Brasil está fora das cadeias globais de valor. O que seria a razão para o seu atraso e agora da crise.
São duas verdades, mas pouco compreendidas na sua real dimensão.
Globalização, na prática significa que as multinacionais tomaram conta de maior parte do comércio internacional, criando e gerenciando as cadeias produtivas dos industrializados. 
Cadeia de valor pode ser um conceito teórico. Cadeia produtiva é uma realidade prática, com nome e sobrenome: a da multinacional que a gerencia.
Isso quer dizer que a maior parte das transações não são mais de exportação e de importação, mas de transferências intraempresa de uma subsidiária a outra, localizadas em países distintos.
Ou seja, quando a sede alemã da Volkswagen decidiu que o Jetta fabricado no México seria vendido no Brasil, foi uma transferência intraempresa. Mas do ponto de vista formal, das estatísticas nacionais e internacionais é uma exportação do México e uma importação do Brasil. 
Com a produção do Jetta no Brasil, para o mercado nacional, o México perdeu uma exportação, o Brasil deixou de importar, para a Volkswagen muda pouco. Continua vendendo o Jetta no Brasil e poucos compradores sabem o local de fabricação. Para eles sempre foi no Brasil.
 
Mesmo quando a transação não é formalmente intraempresa, ela decorre de contratos de longo prazo, dentro de uma cadeia de suprimentos comandado por uma multinacional. 
Em geral os fornecedores também são multinacionais. 
Quando a Volkswagen contrata fornecimentos com a Bosch, não está fazendo isso apenas no Brasil, mas na Alemanha, nos EUA e diversos outros países.

Essa historinha que se difunde que exportar não ocorre a curto prazo, que é preciso todo um trabalho de preparação, criar rede de comercialização, participar de feiras, etc, é para um mercado marginal, que seria em torno de 20% do comércio internacional de industrializados. Às empresas nacionais só restam nichos de mercado. 
As multinacionais não precisam de nada disso e estabelecem com os seus fornecedores suprimentos mundiais. 

Portanto exportar não depende do esforço da direção nacional da subsidiária, mas das estratégias definidas pela sede da multinacional. A Nissan Brasileira não tem que criar uma rede de revendedores na Colômbia para exportar os seus carros. Vai utilizar a rede que já existe vendendo carros fabricados no México. A sua eventual participação em feira no Peru não é para vender o carro brasileiro, mas todos os seus carros, produzidos em diversos países.

A perspectiva de exportações e importações da indústria automobilística instalada no Brasil, assim como de diversos outros setores industriais, depende da visão que os estrategistas das multinacionais tem dos cenários para definir quem produz para quem? Quem transfere para quem?

Nesse sentido, para avaliar as perspectivas de exportação do Brasil, nos próximos anos, não adianta fazer as suas próprias projeções e cenários. É preciso entender ou interpretar como as multinacionais vêm as perspectivas. 

As multinacionais - dentro do conceito de globalização - avaliam os mercados segundo as perspectivas continentais ou dos grande blocos econômicos.

A visão de mercado não é mais nacional. Esse é o segundo ou terceiro nível, a partir da visão continental. No caso o continente é o americano, mas que pode ser desdobrado entre o americano e o latino. Esse ainda desdobrado entre o hispânico e o português. Ou pode ser desdobrado segundo os blocos, como o Mercosul, o ALCA, o Pacto Andino e outros. Agora o TPP.

A visão predominante das multinacionais parece ser a do mercado sulamericano, com a implantação de plataformas de produção continental. 
Isto é, uma multinacional instala uma fábrica no Brasil para atender a todo o mercado sulamericano, ou a todo mercado latino americano. Ou estabelece a fábrica na Colômbia ou no Peru. Ou mesmo na Argentina ou Paraguai. Não para o suprimento nacional, mas continental. 

Dentro das estratégias das multinacionais as plataformas sul americanas não estariam voltadas para o suprimento europeu ou mundial. 

A percepção das estratégias das multinacionais é importante para avaliar o sentido dos acordos comerciais. Os acordos com países da América do Sul teria esse sentido de abertura equilibrada.
Já os europeus querem acordos com o Brasil e Mercosul para aumentar as importações para essas regiões. As multinacionais se instalariam, como já estão instaladas, para as fases finais, principalmente a montagem, para o mercado sul americano, mas com facilidade de transferir peças e componentes. Ou seja, o valor adicionado na América do Sul seria baixo. 
O objetivo da redução das tarifas e das restrições não tarifárias é de combater as importações asiáticas, atualmente concentradas na China. 

A questão para o Brasil e para o Mercosul é negociar as contrapartidas. As multinacionais européias ou instaladas na União Européia, acederiam em transferir produtos fabricados dentro do Mercosul para o mercado europeu? Em que condições?

Os que se opõe ao tratado Mercosul-UE alegam que a UE não quer um acordo, mas a uma capitulação. Com a abertura unilateral, escamoteado com concessões que as empresas brasileiras não teriam condições de usufruir. O acordo só será equilibrado se, em função, do acordo comercial as multinacionais decidirem transferir produtos "made in sulamerica" para as suas unidades européias. Mas ai vem a questão de com que concessões? 

A questão dos tratados e acordo comerciais não é de diplomacia entre países, mas de negociações com as multinacionais. O que para o Governo brasileiro atual é inconcebível.








 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Lula, meio livre

Lula está jurídica e politicamente livre, mas não como ele e o PT desejam. Ele não está condenado, mas tampouco inocentado. Ele não está jul...