Exportar para empregar (6)

Estudos da OCDE (Lanz, R. and S. Miroudot (2011), “Intra-Firm Trade: Patterns, Determinants and Policy Implications”, OECD Trade Policy Papers, No. 114, OECD Publishing. http://dx.doi.org/10.1787/5kg9p39lrwnn-en) confirmam o que temos reiteradamente colocado aqui: a maior parte do comércio internacional de produtos industrializados é realizado intra-empresa. Ou seja, entre empresas integrantes do mesmo grupo econômico.
O setor com maior índice de transações entre países, mas dentro de um mesmo grupo econômico é o veículos automotores (exceto os ferroviários). Nos EUA 81,27%  das importações do setor são intra-firmas. E de outro lado 48,16% das exportações são entre empresas afiliadas. Todos os dados de 2007. Já as exportações originárias da Suécia, 91% são para afiliadas. 
A Suécia é grande produtora de caminhões, com as marcas Scania e Volvo. Esta última também produz automóveis de passeio. No primeiro caso, com fábricas no Brasil, as suas exportações são principalmente de partes e peças para serem utilizadas nas montagens dos caminhões no Brasil. No caso dos automóveis, a exportação é para comercializadoras com participação acionária da fábrica. 
No  caso do Brasil em que todas as empresas montadoras de automóveis são multinacionais, importando e exportando predominantemente por operações intra-empresas, o que pode ser feito para incrementar as exportações do setor? 

Dentro dessa estrutura globalizada, o aumento das exportações do setor automobilístico não decorrerá de operações pontuais ou circunstanciais, com eventual aproveitamento do câmbio favorável. Decorrerá de decisões estratégicas tendo em vista horizontes de médio e longo prazos.

Para que aumentem as exportações de veículos automotores fabricados no Brasil as direções das multinacionais terão que mudar radicalmente o eixo da sua estratégia de produção brasileira, deixando de visar o mercado interno para transformar as suas unidades - parcial ou totalmente - em plataformas de exportação. 

Como os decisores dessas empresas não estão no Brasil, mas em suas matrizes no Exterior é preciso perceber e entender como eles vêem o Brasil e as suas operações no Brasil. 

Até o início da década, o Brasil era visto no exterior como uma das mais promissoras economias mundiais, uma das líderes entre os paises emergentes, então caracterizadas como BRIC. Com uma economia aberta para os capitais internacionais, sem exigências de associação com empresas nacionais (como ocorre na China) as principais multinacionais do setor buscaram uma participação nesse mercado, acreditando que ele poderia assegurar uma demanda que nos países mais industrializados já estaria se esgotando.

Reivindicaram benefícios dos Governos e em os obtendo se instalaram ou ampliaram as suas unidades fabris, aumentando substancialmente a oferta.

O Brasil não só deixou de efetivar as perspectivas, como regrediu gerando grande decepção para os dirigentes das multinacionais que decidiram e promoveram a ampliação da produção brasileira. Mas o discurso deles para o seu público é que pensam a longo prazo e mantém a crença de que o Brasil tem um grande futuro.

Com a crise e retração continuada da demanda interna as direções das multinacionais tem que optar por:
  1. manter-se voltado para o mercado interno, reduzindo a produção, demitindo parte dos trabalhadores e aguardar a retomada, ainda que essa demore, ou
  2. reverter as unidades produtivas em plataformas de exportação.

Na primeira opção seguirão na crença de que o Brasil é o país do futuro, de que a crise é passageira e a economia irá retomar o seu crescimento com todo vigor a médio e longo prazos. Enquanto isso não ocorre permanecerão trabalhando "low profile". 

Não fizeram a opção, quando da instalação,  pela plataforma de exportação porque a política governamental sempre foi contra.

Agora não podem optar pela plataforma de exportação, porque como não instalaram as suas unidades como tal, mas para atender a um mercado interno com padrão de veículos específico (o carro 1.0) e menores exigências de qualidade, esse veículo não tem mercado externo amplo. Não atende às demandas dos mercados mais exigentes, como o americano e o europeu. 

As eventuais exportações seriam para alguns paises da América Latina e africanos. De forma pontual. Como medida circunstancial e não estratégica de longo prazo.

As unidades não foram suficientemente automatizadas ou robotizadas para alcançar niveis mais elevados de produtividade.

O carro brasileiro, de menor qualidade que o mundial, não decorre das condições nacionais, mas da opção deliberada das direções das multinacionais em focar apenas um mercado nacional que seria suficientemente grande.

O carro brasileiro não é de menor qualidade porque o trabalhador brasileiro é menos preparado, ou porque há deficiências de infraestrutura. Mas porque foi projetado para ser desse padrão pela empresa.

Em síntese, planejaram e implantaram um parque produtivo para o "carro brasileiro" e não para o "carro mundial".  Não foi uma decisão do Brasil, mas das multinacionais.

Voltamos à questão anterior: o que pode levar as direções das multinacionais a reverter a sua capacidade produtiva em plataforma de exportação?

(cont)




 



 

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