Revoluções industriais e verdes

O Brasil é um enorme país, com um grande território ocupado desigualmente. Essa desigualdade territorial se refletiu numa desigualdade social e econômica, com uma região assumindo o papel do todo e fazendo o restante do país dependente e subordinado daquele.

O Brasil era um país subdesenvolvido até por volta dos anos 60. Ai deu um grande salto com a industrialização voltada para o mercado interno. Concentrou-se na região sul-sudeste, principalmente no eixo São Paulo-Rio de Janeiro, no entorno das suas principais rodovias.

A partir da indústria siderúrgica pesada, iniciada no Rio de Janeiro, em Volta Redonda, ingressou na 2º Revolução Industrial, com a implantação de diversas montadoras de automóvel, dentro da tecnologia da linha de produção fordista. E criou um grande contingente de trabalhadores urbanos que deram suporte aos sindicatos.

O Nordeste, que havia iniciado o processo de industrialização, a partir da cana de açúcar, permaneceu com tecnologias rudimentares, passando a depender do suprimento da indústria paulista. A tentativa de industrialização, através da SUDENE não prosperou e só veio a ocorrer, em escala maior, com o polo petroquímico de Camaçari, mas não conseguiu consolidar uma cadeia produtiva ou alavancar um desenvolvimento sustentável. 

Já a região central do país, assim como a Norte,  permaneceram com ocupação rarefeita e uma economia subdesenvolvida e desprezada. Nem mesmo a instalação da capital federal, no planalto central,  em Brasília e o estabelecimento de uma rede viária de ligação das diversas capitais com o DF mudou substancialmente o quadro de ocupação territorial e de subdesenvolvimento.

A região sudeste-sul, com a industrialização e expansão das suas metrópoles representava o avanço a modernidade. Era o Novo Brasil, contrapondo-se ao Velho Brasil, dos "coronéis", latifundiários que dominavam a política pelo controle econômico dos eleitores. 

A economia brasileira seguiu uma trajetória de crescimento baseada na economia industrial do sudeste-sul funcionando essa região como a metrópole e o restante como uma colônia. Com dois papéis: ampliar o consumo da produção nacional, dentro de uma economia fechada e gerar divisas, a partir da exportação de commodities para sustentar as importações complementares da indústria e de dois produtos essenciais, com produção nacional insuficiente: o petróleo e seus derivados e o trigo.

O domínio regional era suportado por legislações nacionais, aplicadas indistintamente a todos, mas baseadas e determinadas em função das condições e necessidades do sudeste-sul. O que valia para a Metrópole, era estendida para a Colônia.

Quando emergiu a globalização e logo a seguir a 3ª Revolução Industrial a indústria brasileira não estava preparada. A sociedade dominante (a do sul-sudeste) optou por não se inserir nesse processo que envolvia a implantação de plataformas de exportação, principalmente para a produção dos eletrônicos, a grande marca ou símbolo dessa nova fase da indústria mundial. Preferiu manter-se fechada e buscar o desenvolvimento de uma indústria nacional de produtos da tecnologia da informação. Voltada exclusiva ou predominantemente para o mercado interno. Exportação só eventual e de excedentes.

Perdeu a oportunidade de manter o dinamismo industrial permanecendo num modelo já então defasado com as mudanças mundiais. Ao não acompanhar o desenvolvimento tecnológico, gerou ampla insatisfação dos consumidores brasileiros. A elite consumidora nacional forçou o Governo a uma abertura da economia. Liderada pela elite de fora do sudeste-sul, com o objetivo de quebrar a dependência do resto do país da indústria paulista. Movida por disputas regionais, a abertura foi feita de forma unilateral e voluntariosa, com graves prejuízos para a indústria nacional já instalada. Começou ai a decadência da indústria brasileira levando ao processo de desindustrialização da economia brasileira.

A 3ª Revolução Industrial não se caracterizou apenas pela tecnologia da informação, seja nos produtos como nos processos industriais. A principal característica foi a globalização das cadeias produtivas industriais. O Brasil entendeu errado o processo de globalização confundindo-o com a abertura da economia. Entendeu apenas uma parte do processo.
O associar a política de abertura da economia com a oposição ou resistência às plataformas de exportação, o Brasil se inseriu na ponta final das cadeias produtivas. Tornou-se montadora final dos produtos globalizados, para atender ao seu mercado interno e não se inseriu como supridora industrial das cadeias produtivas globais. O resultado foi o crescimento sucessivo do déficit comercial da indústria, culminando com o déficit global, isto é, de todos os setores da economia, no ano de 2014. 

A par das revoluções industriais, mas evidentes, desenvolveu-se uma revolução agrícola, baseada na tecnologia. Inovações tecnológicas para aumentar produtividade da produção agrícola, em relação à terra, investimentos e trabalhadores. A grande mudança ocorreu com a chamada Revolução Verde, com o uso intensivo de fertilizantes e defensivos químicos, desenvolvimento de sementes híbridas e ampla mecanização do processo produtivo, desde o preparo da terra, semeadura  e colheita das safras.  A segunda ocorreu no campo da genética, com as biotecnologias, principalmente com sementes geneticamente modificadas. Ao mesmo tempo foram incorporadas as tecnologias de informação ao planejamento da produção e à sua execução, acoplando-as às máquinas agrícolas. No campo da pecuária o desenvolvimento das vacinas foi fundamental para o crescimento continuado dos rebanhos. 

A agricultura vegetal e a pecuária bovina, suína e avícola foram transformadas em agronegócio, com grandes produções e fortemente dependentes da indústria química.

O Brasil se inseriu nessa revolução com inovações que o tornou um dos maiores produtores de alimentos do mundo, reconhecido apenas marginalmente pela sociedade industrialista do sudeste-sul.

Tornou-se um grande produtor de soja, baseada na tecnologia da fixação natural do nitrogênio, dispensando o uso do fertilizante químico. E junto com a soja, veio o milho, ampliando a produção de grãos.

Iniciada na região sudeste-sul, ocupando áreas territoriais favoráveis, criando e expandindo uma infraestrutura logística, expandiu-se para a região do centro-oeste com novos modelos de produção.

Encontrou condições favoráveis para a introdução e desenvolvimento da Revolução Verde, produzindo imensas safras destinadas a exportações. Essa produção manteve a dependência das novas regiões produtoras à infraestrutura logística do sudeste-sul. Onde estão os principais portos de escoamento para o exterior dessas grandes safras.

Expandindo-se a partir da região central, em direção ao oeste, para o norte e para  o nordeste, explorando as áreas do cerrado brasileiro o agronegócio passou a buscar o escoamento da sua produção pelo norte do país. Em que pese a precariedade da infraestrutura logística. 

A crise econômica do Brasil com a evolução negativa do PIB, fez emergir na percepção da sociedade do sudeste-sul o agronegócio do "resto do país", evidenciando uma linha divisória imaginária, que seria o paralelo 16. Foi uma linha divisória para efeitos logísticos. Abaixo do paralelo 16 o mais conveniente seria permanecer com o escoamento da produção pelos portos do sudeste-sul. Acima do paralelo 16 seria mais econômico escoar a produção pelo norte, gerando oportunidades de investimentos, principalmente privados para a criação de terminais portuários e outras facilidades logísticas. Está em curso a implantação de um conjunto de porto, caracterizado como Arco Norte. Ainda pouco conhecido, frquentando apenas as páginas e espaços televisivos especializados. 

O paralelo 16, no entanto, não marca apenas diferenças de localização das safras agrícolas, mas mostra condições macroeconômicas diferenciadas entre dois Brasis. 

Enquanto o Brasil abaixo do paralelo 16 convive com a maior crise econômica, com redução sucessiva do PIB e aumento do desemprego o Brasil acima segue uma trajetória de crescimento, em que pesem as adversidades climáticas. É responsável pelo único indicador macoeconômico positivo: os saldos comerciais. 

O Brasil Industrial, que se concentra abaixo do paralelo 16, apesar da crise interna, continua apresentado déficits comerciais nas transações fisicas com o exterior, ampliadas pelas importações de serviços.  A indústria brasileira continua importando mais do que exportando. Ainda não se reorientou para o mercado mundial, preso aos paradigmas do passado, tentando  revitalizar o mesmo e moribundo modelo de "substituição de importações". Um ano e meio após a reversão da política cambial, não deu significativas mostras de mudanças. A indústria brasileira calcada na 2ª Revolução Industrial, segue demitindo. E, com isso, enfraquecendo mais ainda o consumo interno. 

Apesar da recessão, do déficit fiscal, o Brasil não ficou internacionalmente mais vulnerável por conta dos superavits comerciais gerados pelo agronegócio, já sedido predominantemente acima do paralelo 16. Emergiu com uma nova área  de produção, mais ao nordeste, caracterizado como Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piaui e Bahia) que, apesar da quebra da safra atual, tende a ser a maior área produtiva de grãos. Bem acima do paralelo 16, com o escoamento da sua safra pelos portos do Norte. 

Numericamente, toda expansão da safra de grãos para os próximos anos, sairá pelo Norte e não mais pelo sudeste-sul. O Brasil Norte, acima do paralelo 16 está se tornando independente do Brasil Sul, abaixo do paralelo 16. 

O que é uma grande ameaça e também uma  enorme oportunidade.   

Desenvolveu uma revolução quase silenciosa.   




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