Um relatório decisivo

O relatório do deputado Jovair Arantes ainda vai ser discutido amplamente com cerca de 150 deputados, entre membros titulares, suplente e líderes se manifestando durante 10 ou 15 minutos cada um. Vai ser "um saco", com muitas ausências e deputados dormindo  nas suas cadeiras e funcionários com cartazes contra e a favor do impeachment.

Com o relatório desmontando os argumentos da defesa e acatando os da acusação, os discursos não serão voltados para os colegas, seja para conversão dos já definidos, como a conquista dos votos dos indecisos.

A maioria dos indecisos já se definiu, mas não abre ainda o seu voto, aguardando uma melhor configuração do conjunto dos votos, ou seja, do resultado mais provável.

Os discursos serão destinados aos seus eleitores e não aos colegas. Cada qual solicitará da TV Câmara, o trecho do seu discurso para difiundir na sua base eleitoral.

O teor do relatório Jovair Arantes tem relevante importância para a conquista dos votos dos indecisos, pela forma como foi apresentada. É uma peça fundamentalmente jurídica e não política. Como o deputado não é advogado, mas um cirurgião-dentista - na sua profissão original - um peça vazada em termos jurídicos significa que os seus assessores jurídicos não encamparam os argumentos técnicos da defesa feita pelo Advogado Geral da União. E o relator subscreveu os termos preparados por aqueles.

O conteúdo político  se fixava em três pontos: a) impeachment é golpe; b) a abertura do processo de impeachment era ilegitimo, porque fora movido por vingança pessoa do Presidente da Câmara; c) há um conjunto de supostos crimes adicionais, apontados na delação do Senador Delcídio Amaral.

Os contrários ao impeachment da Presidente Dilma insistirão na tecla  do golpe, embora a própria Presidente tenha alterado o tom do discurso, reconhecendo que o impeachment - em tese - não é golpe. Mas que impeachment sem crime é golpe. O relatório Arantes adota o entendimento que existem fundamentadas demonstrações e razões de que ocorreram crimes de responsabilidade.  E que por isso o processo deve ser admitido e aprovado pela Câmara para encaminhamento de julgamento pelo Senado.

O relatório rejeita, com base jurídica de que as eventuais intenções malévolas do Presidente da Câmara, ou o fato dele estar sob investigação,  não invalida a sua decisão porque enquanto no exercício do cargo tem a competência para admitir ou não um processo de impeachment. O direito brasileiro é formalista. E como tal não interessa as motivações pessoais para as decisões. O que vale é o estrito cumprimento da lei. 

Ao admitir a legitimidade do processo, até mesmo validado pela Presidente, ao apresentar formalmente a sua defesa perante a Comissão Especial do Impeachment, o que resta ao defensores da Presidente e contrários ao impeachment é contestar politicamente que os fatos apontados não constituem crime de responsabilidade.

O que prevalecerá será o discurso de que o processo de impeachment é golpe, porque não existe crime de responsabilidade. 

Os discursos dos contrários ao impeachment irão insistir nessa tecla do golpe, porque não aceitam a imputação de crime, de suspeita ou indício de crime  das pedaladas e da abertura dos créditos suplementares por decreto, sem a devida autorização legislativa. 

O relatório Arantes afunilou o processo para essas duas questões e sob aspectos jurídicos.  Não aceitou a argumentação do Advogado Geral da União, de que as pedaladas eram usuais. Que todo mundo fez e foram irrelevantes. Não acatou o argumento político de que "todo mundo fez e faz" e que foram irrelevantes, usando os dados do Tribunal de Contas da União e do Banco Central dos volumes e tempos de uso dos recursos dos bancos estatais. 

Não podendo refutar a ocorrência e a relevância das pedaladas fiscais, só restou - como argumento técnico - defendido por José Eduardo Cardoso, de que pedaladas, infringem a Lei de Responsabilidade Fiscal, mas não se configuram crime de responsabilidade. A questão é usar essa argumentação para convencer os indecisos. 

Esse seria o principal ponto de defesa da Presidente. Pedaladas fiscais ocorreram. Não só em 2014, mas também em 2015. Poderia ser considerada uma ofensa à Lei de Responsabilidade Fiscal, tanto que foi corrigida, em 2015, gerando um brutal déficit primário. 

Mas, atentado à lei de Responsabilidade Fiscal não configura crime de responsabilidade da Presidente. 

Vão insistir "ad nauseam" nessa tese, tentando dar argumento técnico aos indecisos que aderirem à tese contrária ao impeachment.

"Pedalada não é crime. Não havendo crime o impaechament é golpe".

Provavelmente os indecisos são aqueles que concordam com as teses da acusação e percebem a fraqueza dos argumentos da defesa, mas não assumem claramente uma posição a favor do impeachment por razões de interesse político ou pessoal. A tendência ficar contra o impeachment , precisando o Governo pagar muito alto para mudar essa tendência.

 Mas o argumento definitivo - de natureza política, mas fundada em interpretação jurídica - é de que ao editar os créditos suplementares, fora da autorização legislativa, a Presidente usurpou o poder do Legislativo. Indicamos, anteriormente, aqui neste blog, que a ofensa aos deputados e senadores poderia ser o grande argumento dos parlamentares para se posicionar a favor do impeachment. 

Usurpar o poder do legislativo em questão orçamentária é um atentado contra a lei orçamentária e crime de responsabilidade do Presidente, como está explícito na Constituição Federal. 

Tecnicamente há espaço para interpretações, porque a falha foi corrigida por decisão do Congresso e foi uma infração leve. Que tecnicamente não daria margem à aplicação da pena máxima.

Mas ao transformar essa infração em ofensa institucional. Ao considerar o fato real de que o Executivo usurpou o poder do legislativo, o relator a caracterizou como infração gravíssima. 

E essa é a versão que vai prevalecer na continuidade do processo. Que será facilmente absorvida pelos corações e mentes dos parlamentares.

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