E agora?

O Banco Central, afinal, não aumentou a taxa nominal de juros, o que significa uma redução da taxa real. O dito "mercado" que não é a economia privada como um todo, mas o sistema financeiro que envolve os investidores, as instituições financeiras, os economistas, consultores que são seus porta vozes e os colunistas da mídia que difundem a opinião desses, fazendo a sociedade crer que refletem a economia. É o mercado financeiro, uma parte da economia.
Pois o mercado está insatisfeito e até furioso, porque a decisão foi uma reversão de expectativas e querem fazer crer que a decisão foi por ingerência política. Não se trata apenas da perda, não esperada de alguns bilhões, com o não aumento da SELIC, mas a insegurança com relação às decisões futuras. Agora a expectativa é em relação à ata da reunião, que não deverá trazer grandes novidades, repleta de sofismas e reafirmando a disposição do Banco Central em utilizar os juros como instrumento de combate à inflação. Ou seja, manter a perspectiva ou "ameaça" de aumentos futuros, se a inflação não ceder.
O fato mais grave que os analistas ainda não se detiveram é que não houve mudança de modelo. Foram os próprios "pais" do modelo que avaliaram a ineficácia do instrumento para conter a inflação, numa conjuntura de recessão progressiva. 
Ou seja, o Banco Central seguiu uma mudança na perspectiva do FMI. A decisão não foi heterodoxa, mas rigorosamente ortodoxa, seguindo a cartilha do FMI.
 
O que o mercado financeiro vai fazer é razoavelmente conhecido. A primeira reação é especular com o câmbio. Dada a incerteza a investidores mais afoitos saem da sua posição em títulos do Tesouro para aplicações cambiais. Isso se reflete no mercado financeiro como um todo. Esse aumento do dólar se reflete na inflação. O resto pouco influi. Por que, independentemente do Banco Central manter a taxa básica, o sistema financeiro vai aumentar os juros na ponta.

O importante é saber como vai reagir a economia real? Como vão se comportar os consumidores finais, os produtores industriais e de serviços? O comércio é fator derivado. Supostamente a questão é de confiança. E o mercado financeiro faz terrorismo difundindo a noção de que com a suposta perda de autonomia do Banco Central, as perspectivas da economia vão piorar. 

Para os consumidores finais, a manutenção da SELIC pouco vai mudar. Eles vão continuar contendo as compras, mesmo os que ainda tem empregos e renda. Os desempregado vão conter mais ainda, e como vem aumentando o número deles o consumo global deverá continuar caindo. Aumento de crédito pouco vai influir, dado o esgotamento da capacidade de endividamento do consumidor final. Ademais os juros continuam elevados.

O único fator que poderá levar o consumidor final, por conta própria, aumentar o consumo será o barateamento dos produtos. Seja pela redução generalizada da inflação, pelas grandes promoções, redução em decorrência da redução de tributos ou de serviços básicos ou ainda de decisão dos produtores e comerciantes em baixar os preços de forma mais permanente (não apenas em promoções). 

A inflação que aparece nos modelos econométricos é resultado da variação dos preços dos produtos (bem e serviços) promovidos pelos agentes econômicos. Sejam os industriais, prestadores de serviços, como os intermediários, principalmente os comerciantes de varejo: que repassam os aumentos para o consumidor.

Porque os agentes econômicos vão aumentar os preços dos seus produtos se com isso vão vender menos? Para manter o nível de receitas? Se continuarem nessa prática só vão agravar a recessão.

Eles vão aumentar os preços porque são influenciados pelo mercado financeiro e seus porta-vozes que dizem a todos os demais incautos que a inflação vai aumentar porque os juros não aumentaram. É a profecia auto-realizada. É a inflação auto-alimentada.

Só não vai acontecer se em vez do Banco Central, ou do Governo, o mercado financeiro e seus porta-vozes perderem credibilidade. Se os agentes da economia real perceberem que ao mercado financeiro interessa a ocorrência da inflação,  irão continuar alimentando a inflação elevando os seus preços, dentro das cadeias produtivas?

Por que o modelo de política econômica do tripé macroeconômico, inventado pelo Consenso de Washington diz que a única receita para combater a inflação é o aumento dos juros. Com isso ganha o mercado financeiro. Aumenta o juro nominal, cai a inflação e aumenta o juro real. Funciona e  bem até um certo ponto. A partir dai não funciona. No Brasil esse ponto teria sido ultrapassado, por diversas circunstâncias. O pai do modelo, o FMI, percebeu e acha que não funciona na conjuntura atual.  E teria influenciado a decisão do Banco Central.

Não seria a mudança do modelo. Mas mudança dentro do modelo. 

O mercado financeiro, no entanto, assim não entendeu, não se conforma e continua, através dos seus porta-vozes prevendo uma inflação descontrolada. Só que o mercado financeiro não determina a inflação. Não é ele que precifica os produtos.

Quem promove a inflação é a economia real. Se essa seguir o que o mercado financeiro diz, haverá inflação. Vai continuar aumentando os preços. Mesmo contra os seus interesses. Na base do "Maria vai com as outras".
Se essa reagir por decisões próprias, a inflação será controlada como esperam os modelos. E o próprio mercado financeiro voltará a ganhar. Por que os juros reais aumentarão pela diferença em relação aos nominais. 

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