Os Brasís acima e abaixo do paralelo 16

Se perguntar aos goianos o que é o paralelo 16 eles dirão que é o melhor festival de dança do Brasil. Para espicaçar os catarinenses. 
Para o agronegócio significa a linha divisória de preferência de escoamento da safra de grãos. A produção abaixo do paralelo 16, tendo a linha do Equador como referência, continuaria sendo escoado pelos portos do sudeste e sul. Já a produção acima do paralelo 16 deveria ser escoado pelos portos do Norte.

Em 2013 a então Presidente da CNA e Senadora da República, Kátia Abreu, trazia a público, na sua coluna da Folha de São Paulo, o paralelo 16, o Arco Norte e Matopiba.
Quantos leram e prestaram atenção? Eu não li, nem fiquei sabendo.
Como para a maioria dos brasileiros letrados só sei que paralelo é uma coordenada geográfica, que aprendi no primario (ou seria no ginásio) e não tinha a menor idéia por onde passava. Nem o que significava.
Só fiquei sabendo recentemente (final de 2015) e essas três figuras (Paralelo 16, Arco Norte e Matopiba) continuam sendo ilustres desconhecidos. Alguns dos meus interlocutores e leitores já ouviram falar mas não sabem bem o que é.
Tenho comentado aqui esse tal paralelo 16 que é uma linha imaginária, que só está nos mapas. Não há nenhuma cerca, nenhum elemento físico demarcando na realidade essa linha.

A produção de grãos no Brasil se concentrou no sul e foi se expandindo na direção norte, seguindo a trilha do café - em função da qualidade das terras - e depois da pecuária. Essa desmatava e preparava a terra para a produção de grãos. 

As condições favoráveis do cerrado, associadas à tecnologia propiciaram uma ampla expansão da produçãe o dos grãos - soja e milho - ocupando sucessivamente o território na direção norte. As novas fronteiras agrícolas foram ficando cada vez mais próximas das saídas norte do que as saídas sudeste-sul (Santos e Paranaguá).

O Brasil acima do paralelo 16 era um grande vazio, exceto no seu entorno, onde se situam duas capitais estaduais (Cuiabá e Goiânia), a capital federal (Brasília)  o litoral. Este abrange todo o litoral do nordeste, a partir do sul da Bahia. 

Vazio e subdesenvolvido, porque o desenvolvimento econômico e humano do Brasil se concentrou na região sudeste-sul, abaixo do paralelo 16. Nesta se desenvolveu a indústria, ampliou-se a infraestrutura, estruturaram-se os centros financeiros, educacionais, culturais, serviços de saúde e outros.

Seis décadas após a decisão de Juscelino Kubitschek   decidir transferir a Capital Federal para a região Centro-Oeste, na região do paralelo 16, o Brasil - acima desse paralelo - começa a emergir como "um novo futuro", "uma nova esperança". Pela ação dos novos desbravadores, dos novos bandeirantes, empreendedores modernos que buscaram novos horizontes.

A imensa produção de grãos acima do paralelo 16 é uma realidade, em contínuo crescimento - apesar de uma pequena quebra em 2016 - mas continua carente de infraestrutura, o que ainda leva o escoamento pelos portos do sudeste-sul.

A implantação de uma infraestrutura logística para viabilizar o escoamento pelo norte promoverá uma expansão ainda maior da produção. Pelos ganhos de competitividade. E para a qual o mundo tem demanda. 

Mais uma vez, na história, o futuro do desenvolvimento brasileiro está em produtos "primários", ou em "commodities".

 O crescimento econômico, segundo os indicadores econômicos, está assegurado. As circunstâncias mundiais são favoráveis ao agronegócio, ao contrário do que ocorre para a indústria brasileira. E as perspectivas, ainda mais favoráveis.

As questões maiores estão nos impactos ambientais desse crescimento, na concentração de renda e desigualdade social, na estruturação setorial e na integração com o Brasil abaixo do paralelo 16.

A primeira é se esse crescimento poderá ser feito, com a preservação florestal, sem o agravamento da contaminação do solo e das águas com os agrotóxicos e reduzindo os impactos climáticos?

O crescimento do agronegócio está produzindo uma nova elite empresarial e "novos ricos". Terá essa elite condições para promover um desenvolvimento mais equitativo e sustentável?  Ou tenderá a uma concentração de renda e urbana mantendo milhões em condições de pobreza?

Um desenvolvimento mais equitativo significará a expansão de uma sociedade de consumo gerando demandas adicionais para os serviços e para a indústria. Com o concomitante desenvolvimento do comércio. 

A produção agrícola tem pequena participação na formação do PIB e na geração de empregos. Mas envolve uma ampla cadeia produtiva geradora de renda e de emprego.

A renda gerada na região decorrerá da captação de renda externa. E também poderá ser gasta predominantemente no exterior. Seja pela importação de insumos para a produção, como dos bens de consumo utilizados ou absorvidos pela elite regional. Repetir-se-ia o mesmo modelo "colonial".

Poderá ainda buscar a "importação" interna comprando os bens e serviços do Sudeste-Sul.  Contribuiria para o crescimento nacional, como um todo. E promoveria maior integração entre as duas regiões.

Tenderá atrair à região os grandes fornecedores de insumos, o que ocorrerá ou não pelas condições de competitividade das empresas. Mas haverá sempre a tentativa de intervenção do Estado para induzir essa instalação, gerando distorções.

Os produtores tenderão a comprar os insumos pela qualidade e pelo preço. As multinacionais buscam a conquista do mercado pela especificidade e qualidade dos seus produtos. Para isso investem pesadamente em pesquisa & desenvolvimento, em escala mundial, para obter inovações que atraiam os comparadores. O seu produto é protegido por patentes, mas esses não impedem que concorrentes desenvolvam similares. O que leva tempo, maa concorrência - instalada regionalmente - pode conquistar o mercado, com produtos mais baratos.

Uma das condições essenciais para a instalação de uma unidade industrial - no contexto de uma economia globalizada - é a escala de produção. O que está relacionada com a escala de demanda. Essa existe na produção agrícola e pecuária do Brasil acima do 16

Havendo dois grandes polos produtivos, o do Centro Mato-grossense e o do Matopiba, uma localização preferencial seria junto  à ligação entre os dois, o que só existe por meio rodoviário.

A ligação ferroviária Lucas do Rio Verde - Campinorte (na Ferrovia Norte-Sul) que seria o trecho inicial da Transcontinental, ambicionada pelos chineses, geraria os locais preferenciais.

Planos, com os traçados básicos das rodovias, ferrovias e também hidrovias existem. São até oficializados, com a inclusão no Plano Nacional de Viação,  condição obrigatória para a sua implantação. 

Mas a inclusão no PNV não é garantia de implantação: é  necessária, mas não suficiente.

Uma condição necessária é o financiamento. Os recursos existem, no mundo. O problema está na decisão do detentor ou gestor dos recursos em aplicá-los em empreendimentos específicos.

O investidor se baseia em estudos de viabilidade para a sua tomada de decisões. Mas os estudos tendem a adotar premissas otimistas para justificar o empreendimento. O que nem sempre ocorre na realidade. 

Quando o recurso é público intervém outros fatores, como o voluntarismo da autoridade e as injunções políticas. 

O elemento fundamental deve ser um plano nacional indicativo. Que precisa ser estratégico.

Em próximos artigos trataremos desta questão, com explicações e reflexões sobre a condição estratégica do plano.  
        

 

 

   


 

 

 
 

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