Assumindo que o diagnóstico anterior está correto e que o problema não está na só e nem principalmente na "falta de educação do povo", ou na atuação da máquina partidária, na compra do voto, no horário da televisão ou do populismo - que estão nos diagnósticos mais comuns e simplistas de que "o povo não sabe votar" - o que pode ser feito para mudar essa situação?
O ponto de partida para uma estratégia renovadora ou modificadora da situação politico-eleitoral atual é reconhecer que "o povo sabe votar". E que o eleitor vota no que acha que será bom ou melhor para ele e para a comunidade onde ele vive. Isto é para o mundo que ele conhece.
E reconhecer as condições estruturais do Brasil, com os seus diversos elementos constitutivos.
O primeiro elemento, de natureza estrutural é que não haverá qualquer mudança, a curto e médio prazo do papel do Estado provedor.
Com a Emenda Constitucional do Teto de Gastos haverá toda uma batalha em relação às verbas públicas, mas todos defendendo a manutenção da forte atuação do Estado nos serviços públicos de saúde e educação básica.
Todos os discursos continuarão os mesmos: "educação e saúde de qualidade". O que é isso e como se aplica caso a caso, fica à interpretação ou a imaginação de cada um.
Mas o entendimento comum é que será necessário ampliar e melhorar os serviços públicos em saúde e educação básica.
Haverá eleitor disposto a abrir mão de ter serviços públicos de educação e saúde de qualidade?
Seja veterano ou novato, defender educação e saúde de qualidade é condição essencial: necessária mas não suficiente.
Significa que quem não defender educação e saúde de qualidade, não sai da linha de partida. Provavelmente não terá registro da candidatura, qualquer que seja o partido. E mesmo com o registro não terá votos. E não será eleito ou reeleito.
A solução, já praticada pelos países mais desenvolvidos é um atendimento universal e de qualidade, com adequada distribuição entre os serviços públicos e privados, de tal forma que o tema saia da agenda política.
Ninguém precisa defender educação e saúde de qualidade porque essas já existiriam, seriam a situação normal. E com isso o deputado perderia a função de despachante. Deixaria de sê-lo por desnecessidade da atividade. E teria que se voltar para a representatividade. Para as questões mais gerais e com diferenças ideológicas.
Essa condição dos países desenvolvido, no entanto, está longe do nosso horizonte de curto e médio prazo. Ou em termos de calendário: os deputados ainda terão a função de despachante, como a predominante nas eleições de 2018 e 2022. Pode-se esperar alguma mudança evolutiva que rompa em 2026.
Para que o eleitor deixe de votar no despachante é preciso que ele perceba que o seu despachante é ineficaz. Ele não trouxe ao eleitor o que ele prometeu, ou o que o eleitor esperava. E, em alguns casos, ele é corrupto, "ladrão" e coisas piores.
Dentro das circunstâncias de um Estado provedor ineficiente, em que o eleitor ainda precisa de intermediação para ser atendido, uma campanha anti-reeleição terá que mostrar e tentar convencer o eleitor, principalmente o de baixa renda, que o deputado federal, como condição geral é ineficaz, e os seus deputados atuais em particular.
O descrédito do eleitor com os políticos tem que ser canalizado para a contestação do papel do deputado como despachante de interesses pessoais e locais, em relação aos serviços públicos.
(cont)
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