O grande equívoco da democracia (5)

A pessoa, que em momentos eleitorais, vira eleitor ou eleitora, não vai escolher entre o político de direita ou de esquerda, entre aquele que é a favor ou contra a maior intervenção do Estado na economia. 

Ela vai votar naquele que promete ajudar a melhorar os serviços de saúde pública no seu Município ou que interfere para que ela seja atendida, "furando a fila" nos serviços públicos de saúde. 

A sua decisão de voto não é ideológica. É pragmática. Ou em termos "chulos": fisiológica. Ela quer ser atendida, ou ela quer melhorar as perspectivas de atendimento.

A perspectiva é de que votando em fulano ele irá interceder a seu favor para o atendimento da sua necessidade de consulta, exame ou tratamento quando precisar. Porque tem alguém da família ou conhecido que conseguiu ser atendido prioritariamente, com a interferência do político.

Todo os políticos podem prometer a mesma coisa, igualando a disputa, mas ai entra a estrutura de poder. Que envolve o Prefeito Municipal e as chefias regionais ou locais dos serviços federais ou estaduais. 

O processo é circular e retro-alimentado. O político, candidato a deputado federal, estabelece uma parceria com o Prefeito Municipal, ou com o candidato a Prefeito Municipal, para conseguir os votos da comunidade ou Município, oferecendo - em contrapartida - o direcionamento das emendas parlamentares a favor do Municipio e a interferir na nomeação dos chefes das repartições públicas, sejam federais ou estaduais. Gera, com isso, um processo de alimentação contínua. 

O sistema mais eficaz e por isso mais duradouro da política brasileira foi montado por José Sarney, através do qual dominou a presença do Estado Brasileiro no Maranhão e interferiu nas políticas e gestão públicas. Embora o "Sistema Sarney" tenha perdido eficácia, ainda é um poder relevante no Maranhão. 

Esse processo que domina, na prática, na realidade, embora indesejada e contestada pelos cientistas políticos, tem origem e base na ampla prestação de serviços públicos pelo Estado, principalmente os de caráter social.

Ser a favor de um Estado provedor e quanto maior melhor, dá votos. Ser contra e defender a privatização,  ou um Estado menor, não dá votos. 

Os "ideologicamente estatizantes" são maioria no Congresso, os defensores de um Estado menor, minoria. E mesmo os que defendem um Estado menor, defendem a preservação da atuação do Estado nas áreas de educação e saúde.

Dizer que os estatizantes são populistas e os demais não, é uma simplificação. Em matéria de um Estado provedor, são todos populistas. Com diversas matizes de discurso.

Todos defendem um Estado provedor universal, isto é, que atendam a todos que o procure. Mas isso não ocorre na prática: há filas enormes para obter uma consulta num posto de saúde, não se consegue matrícula para o filho próximo da casa, há um fila de espera enorme para obter uma vagas numa creche, etc, etc.

É diante da deficiência de atendimento que entra o político. O político é o meio para "furar a fila". 

E "furar a fila" é um meio indireto de "compra de voto". 

Dentro dessas circunstâncias de defesa de um Estado provedor que não consegue atender a todas as demandas que os candidatos a deputados emergem como candidatos a despachantes dos interesse pessoais dos eleitores ou da comunidade, para obtenção ou melhoria de atendimento pelo Estado.

Os deputados são a parte do Estado que agiliza os processos retardados pela burocracia, que canaliza as verbas das suas emendas parlamentares para os Municipios nos quais tem parceria com os políticos locais, que interfere nas decisões setoriais dos órgãos governamentais para atender aos seus redutos eleitorais, que interfere na nomeação de autoridades, em diversos níveis, para facilitar o seu trabalho de intermediação, que mantém escritórios políticos para "furar a fila" nos atendimentos pelo Estado.

E o deputado eficaz nessas atividades, consegue se reeleger. E o candidato que estabelece as parcerias necessárias consegue-se eleger, dentro das vagas deixadas pelos não reeleitos.

O eleitor sabe que o político em que vota nem sempre é honesto, que estabelece ou participa de acordos espúrios, mas é complacente, desde que o político seja eficaz na atividade de "despachante" e traga resultados concretos ainda que pontuais a ele -eleitor.

Com as revelações todas sobre corrupção, sobre venda de votos, há um sentimento de revolta contra os políticos, mas isso não resulta - necessariamente - em não votação neles. O que prevalece é uma cultura comum do "jeitinho". E a aceitação de que todo político é assim mesmo. Se aparecer um novo, com discurso de "seriedade", não terá votos se não prometer ser "despachante" (embora nunca vá afirmar isso expressamente) ou poderá ter votos, com a previsão dos eleitores de que "lá dentro vai virar igual aos outros". Essa percepção é muito clara entre os crentes, isto é, os evangélicos. Não querem o seu pastor no Congresso. Mas votam em quem o seu pastor recomenda.

(cont)
















































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