quinta-feira, 30 de junho de 2016

Os entraves para as concessões de saneamento

É inegável a má condição do saneamento no Brasil, com milhares de áreas urbanas com o esgoto correndo a céu aberto, o despejo direto do esgoto nos córregos, rios e demais corpos d'água. 
Há necessidade de um grande esforço nacional para superar essa condição, porém não há consenso entre os agentes reais da economia e da sociedade. 
De um lado o setor organizado do saneamento estabeleceu o paradigma de que a solução dos esgotos está na coleta domiciliar através de redes coletoras.

Por outro lado os usuários buscam soluções alternativas, em dois segmentos diametralmente opostos: o segmento mais rico, tem buscado a solução de moradia condominial, seja vertical como horizontal e prefere soluções locais para o tratamento de esgotos.

O segmento mais pobre das áreas urbanas que abrange a maior parte dos domicílios não ligados à rede, busca alternativas próprias, principalmente as fossas sépticas.

Na defesa da solução o setor organizado, promovido pelas Cias de Saneamento e a comunidade a elas ligadas, levantam e estimam o déficit de saneamento, mostrando-o como demanda. É um equívoco.

Nem todas as pessoas incluídas no déficit de saneamento querem a solução rede, tampouco vão ligar o seu domicílio à rede de coleta, mesmo que instalada diante dessa. 

quarta-feira, 29 de junho de 2016

PPI (6)

Um empresário ou investidor interessado em obter uma concessão de serviço público precisa pré-investir, correndo riscos de perdas em momentos diferentes: 
  1. de menor prazo, se a partir de gastos com estudos da concessão, ele desiste de concorrer. São gastos relativamente pequenos;
  2. de curto prazo, se investe em gastos maiores com estudos mais aprofundados, reuniões, viagens e outros gastos para composição de um consórcio e preparação de proposta e perde a licitação da concessão;
  3. de médio prazo, quando vencedor da licitação, paga os eventuais encargos, como o valor da outorga exigida, começa a investir em obras e equipamentos e não consegue obter as receitas esperadas, dentro dos prazos previstos;
  4. continuado no médio prazo, se os custos operacionais na prestação dos serviços forem maiores do que os previstos, os valores das amortizações do investimento ou do financiamento forem maiores e a receita efetiva menor. As perdas seriam registradas e demonstradas nos balanços periódicos;
  5. de longo prazo, quando ao findar o prazo da concessão, verificar que o negócio foi deficitário ou com rendimento médio inferior ao de outras aplicações. 
As decisões dos empresários/investidores envolvem sempre grande carga emocional, seja com o tipo de atividade, com a localidade, com a crença pessoal de que "acredito que é um bom negócio", ou convicção de que "vai dar certo, porque tem que dar certo".

Dadas as durações das concessões, algumas de  30 anos ou mais e eventualmente  renováveis, para o empresário não é um negócio para si, mas para legar aos seus herdeiros. Poderá deixar um bom negócio ou "uma bomba" a ser explodida no colo deles. 

Os grandes negócios ou empreendimentos vão deixando de ser cada vez menos pessoais ou familiares para serem institucionais, com os investimentos feitos por centenas ou milhares de investidores, geridos por profissionais em que elementos racionais pesam mais que os emocionais. Crenças ou convicções tem que ser repartidas com um colégio de gestores e numericamente justificadas. 

Se de um lado a institucionalização do controle acionário, promove a racionalização, de outro traz a imediatização dos resultados. As empresas de capital aberto, tem que demonstrar o seu desempenho trimestralmente e os acionistas resultados positivos a cada um desses períodos. O desempenho afeta o valor da ação e reflete no valor global da empresa. O que influe na obtenção de novos recursos.

Esse novo indicador  vale para a maioria das empresas, com ações pulverizadas, negociadas em bolsas de valores, mas não para as que estão no topo do valor .

As empresas com o maior valor de mercado não são as mais rentáveis. São as que tem maiores perspectivas de lucros futuros, como ocorre com as empresas de tecnologia da informação. E muitos investidores preferem se arriscar financiando 'start-ups" do que em negócios consolidados.

Diante desse quadro que nível de informação prévia o candidato à concessão quer ter e o quanto estará disposto a gastar para tê-los?

A resposta pronta e errada do setor privado é: tudo e nada. E do Governo, o mínimo suficiente e o máximo possível.

São as grandes questões que o Governo deve cuidar para atrair interessados às concessões e efetivá-las nas melhores condições para as partes,  para os futuros usuários e para a economia em geral.

A responsabilidade tradicional do Estado é promover os estudos prévios e colocá-los à disposição dos interessados. Esses ainda tem que investir em levantamentos adicionais, nas avaliações, nos cálculos para elaborar a proposta. 

A partir da percepção de que um mecanismo previsto na lei das concessões, poderia eximir o  Governo de arcar com os custos da elaboração dos estudos prévios foram adotados os chamamentos para as MIPs - Manifestação de Interesse Privado, também caracterizados como PMI - Proposta de Manifestação de Interesse. 

Foi uma distorção de um mecanismo para apresentação de iniciativas privadas para a adoção de um concurso público de projetos estruturados. 

O resultado geral foi insatisfatório, com um grande volume de estudos inaproveitados e afastamento de interessados.

O novo Governo indicou alterações no processo, mas ainda não devidamente regulamentados, como já comentado anteriormente. 

terça-feira, 28 de junho de 2016

Fracassos e sucessos da estratégia de "campeãs nacionais"

Com a crise da Oi, reemerge o tema "campeães nacionais" com severas críticas ao que teria sido a estratégia desenvolvida pelos governos do PT de campeãs nacionais. Embora a Oi, tenha tido origem ainda no governo FHC, no bojo da privatização das telecomunicações brasileiras.

A ideia das campeãs nacionais foi ampliada e distorcida. E foi usada para fins escusos.

Não foram só fracassos. Há sucessos. Nem tudo são espinhos. Há flores, mas o que machuca são os espinhos. Mas algumas das belas flores cheiram mal. 

Uma empresa nacional bem sucedida no exterior foi a Construtora Norberto Odebrecht, transformada num grande grupo multinacional, com inúmeros contratos no exterior. Contratando equipamentos e serviços brasileiros. A Operação Lava-Jato demonstrou que esse sucesso foi alcançado com amplo apoio governamental, dentro de uma parceria nada republicana. É a campeã nacional da corrupção.

A maior distorção, no entanto, foi a política de apoio governamental a grupos nacionais para enfrentar, no mercado nacional, as multinacionais.

Essa foi a concepção dos tecnocratas tucanos ao promover a criação de uma empresa nacional de telecomunicações para evitar o total domínio do setor por multinacionais. Com amplo apoio do BNDES.

O modelo foi herdado e desenvolvido pelos governos petistas, com sucessivas distorções o que resultou no colapso da Oi. 

Anteriormente o grupo Eike Batista tinha fracassado na pretensão de criar um grande grupo nacional no setor de infraestrutura, ancorada por uma petroleira privada brasileira. 

A estratégia original das campeãs nacionais era de promover a globalização da empresa nacional e, nesse sentido, nem tudo é fracasso.

A Embraer é a mais visível e admirada. A Vale é um grande sucesso, ainda que empanada pelo desastre de Mariana. Sadia e Perdigão são sucesso mundial, hoje reunidas na BRF. 

O maior sucesso da estratégia de campeãs nacionais, que acabou sendo colocada em prática, pelos governos petistas, é a JBF, conhecida no Brasil pela marca Friboi. Mas com uma ampla rede de empresas na cadeia produtiva da carne bovina, sendo o maior grupo mundial do setor. É porém um sucesso suspeito, com várias ligações políticas ainda sob críticas e investigações. 

Outro grande sucesso, embora não mais reconhecido como da estratégia de campeãs nacionais e a AMBEV. O casamento da Brahma com a Antarctica foi abençoada e patrocinada pelo Governo, então de FHC, com recursos do BNDES. 



segunda-feira, 27 de junho de 2016

Tudo junto e mal misturado

Os economistas aprenderam a transformar cada fato real num número e juntá-los, formando um conjunto numérico do qual tiram a média para caracterizá-lo. 
É forma sofisticada do "tudo junto e misturado", o que leva verdades globais a se tornarem falácias  setoriais.

Um caso recorrente é o da ineficiência da infraestrutura, apontado recorrentemente como um dos principais fatores que prejudica a competitividade do país. Seria responsável pela crise econômica e os investimentos naquela seria a solução para vencê-la.

Junta-se num pacote só as estradas, usinas elétricas, aeroportos, saneamento, transforma tudo em números e compara com números de outros países e verifica-se que nos rankings mundiais de competitividade e infraestrutura o Brasil está na rabeira das listas. 

Mas na realidade existem situações ótimas e péssimas. Juntando tudo e misturando resulta numa média medíocre. 

A indústria brasileira está ainda concentrada em São Paulo. Se essa não é competitiva mundialmente não é por causa da suposta ineficiência da infraestrutura logística.

A economia paulista, ainda a maior do Brasil, não sofre dessa alardeada doença que é a insuficiência da infraestrutura. A carência da infraestrutura é na dimensão social, afetando a mobilidade e o saneamento da população. Principalmente na região metropolitana de São Paulo.

A carência da infraestrutura está nas outras regiões, principalmente "ao norte do paralelo 16" para onde se expandiu o agronegócio e ainda escoa os seus produtos pelas rodovias e portos do sudeste. A maior carência está na infraestrutura logística antes de adentrar o Estado de São Paulo. 


A expansão do canal do Panamá não irá apenas facilitar a pequena exportação de produtos industrializados para o oriente. Ao contrário irá facilitar o ingresso de produtos chineses no Brasil. 

Essa expansão não liga apenas o Oceano Atlântico com o Pacífico. Liga o Pacífico com o Atlântico. 
O novo canal do Panamá irá piorar ainda mais a falta de competitividade da indústria brasileira perante os importados no mercado interno. 


sexta-feira, 24 de junho de 2016

Dinâmica urbana (1): opinião publicada e não publicada

A opinião publicada, ou seja, aquela que frequenta cotidianamente a mídia, ocupa a cidade formal e tem o mercado imobiliário como o principal responsável pela construção ou reconstrução da cidade.

Só que essa parte da cidade não significa mais que 20% do total. 
A maior parte da cidade é construida diretamente pelas famílias, com as suas parcas poupanças, mas que, no conjunto, concorrem com a produção do mercado imobiliário.
E os seus moradores constituem a opinião não publicada, que não está presente na midia e, por isso, é invisível para a opinião publicada.
Mas nas eleições  ela vota e pode mudar os resultados esperados pela opinião publicada. Como acabou de acontecer na Grã Bretanha.

Significa que o responsável direto pelo crescimento desordenado da cidade, gerando problemas como os congestionamentos no trânisto, não é o mercado imobiliário. Embora tenha um papel indireto decisivo. É ele quem promove, impulsiona ou acelera a valorização imobiliária que cria a barreira para a ocupação das áreas melhor servidas por benefícios urbanos pelos sem ou com pouca renda.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

PPI I5)

Com as novas regras para a estruturação de projetos destinados à concessão de infraestrutura o Governo está restabelecendo a prática usual - em âmbito internacional - de contratar previamente os estudos e projetos.


A MIP - Manifestação de Interesse Privado é mais um caso do "jeitinho" brasileiro para contornar dificuldades. Solução aparentemente simples para resolver problemas complexos. Não deu certo. Os interessados nas concessão não confiaram nos estudos elaborados por esse regime. E as licitações deram vazias ou fracassaram. Muitas delas nem foram colocadas "na rua".

As licitações para concessão não tem o mesmo caráter da licitação para execução de uma obra específica. No contrato de obra, caso haja um eventual atraso por falta de licenciamento ambiental, o contratado pode reivindicar os reajustes previstos ou até mesmo aditivos de prazos e valores. 

No caso da concessão, se a responsabilidade do licenciamento for atribuída ao concessionário ele terá que arcar com todos os custos dos atrasos.

Sem um projeto básico de engenharia completo  não se consegue o licenciamento de instalação. Estruturação de projeto para concessão não pode se resumir a uma modelagem econômica-jurídica. Sem uma segura visão técnica do empreendimento que tem duração de longo prazo "não irá parar em pé".

Participar de uma licitação de concessão de serviço público, sem um projeto básico envolve altos riscos econômicos, o que afastará na prática, muitos dos concorrentes. 


quarta-feira, 22 de junho de 2016

PPI (4)

As concessões de serviços públicos são concessões para prestação dos serviços, antecedidos por obras que deem suporte físico aquela prestação.

As concessões rodoviárias - as primeiras a serem estabelecidas a partir da redemocratização - estabeleceram os paradigmas das concessões, com todas as suas distorções.

Nas concessões rodoviárias o investimento inicial é o elemento mais importante e das receitas futuras a maior parte deve ser destinada à amortização dos investimentos. 

No jargão do mercado, o CAPEX (capital expenditure) é mais importante do que o OPEX (operation expenditure). Em todas as demais concessões ocorre o inverso. 

A concessão, como negócio é de prestação de serviços, suportada por grandes ativos físicos. A competência principal requerida para o sucesso do empreendimento está no serviços. O concessionário precisa ser um bom prestador de serviços.

As concessões envolvem investidor e empreendedor.


Investidor e empreendedor nem sempre se confundem numa mesma pessoa. Empreendedor é o que assume e toca o negócio. Assume maiores riscos e busca remuneração consistente com o risco. Já o investidor pode ser apenas um financiador, emprestando os recursos ao empreendedor, em troca de remuneração fixa, isto é, de juros pré-fixados.

O investidor aplica os recursos e os quer de volta, dentro de determinados tempos e vai comparar os seus rendimentos baseados apenas pelos prazos decorridos,  com os decorrentes da exploração de um negócio. 


Já o empreendedor é o que vai criar (ou implantar) o ativo e tem que cuidar durante longo tempo da exploração do negócio para gerar os resultados e remunerar os investimentos.

Também empreendedor e construtor também não precisam ser o mesmo. O empreendedor é o responsável pelo investimento, mas pode contratar uma construtora para executar a obra. O empreendedor é o responsável pelo projeto de engenharia. O que - igualmente - poderá ser contratado com terceiros.

Entender bem essas distinções é fundamental para o eventual sucesso das parcerias público-privadas.
 

terça-feira, 21 de junho de 2016

Imaginário popular e o publicado

O imaginário popular percebe a carestia e cria as suas explicações. Para o consumidor popular é tudo uma questão de especulação e ganância dos comerciantes e produtores que remarcam constantemente os preços. O vilão é a famosa maquininha de remarcar os preços.
O imaginário publicado trata o mesmo fenômeno como inflação e influenciado pelos "especialistas" vê o "dragão da inflação". E está esperando que o São Jorge Meirelles vá conseguir derrotá-lo. 
Para os "especialistas" tudo se resume no controle dos gastos públicos. O que enfrentaria uma forte resistência dos políticos.
A questão básica é se a contenção da carestia vai conter a inflação ou se é a contenção da inflação que vai conter a carestia. É a tradicional "ovo ou a galinha?".
Carestia é um problema real. Não é imaginário. Está presente de fato no dia a dia das pessoas. Já a inflação é uma construção estatística. E gera o mega imaginário popular. É um Brasil - figura imaginária - gerando uma inflação. Que nessa condição não passa de um índice. Mas condiciona as decisões dos agentes econômicos e das autoridades. 
O mundo real é comandado pelo imaginário. 

 

Lula, meio livre

Lula está jurídica e politicamente livre, mas não como ele e o PT desejam. Ele não está condenado, mas tampouco inocentado. Ele não está jul...