sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Fazendo um contorno (ou entrando num atalho)

A economista Dilma Rousseff segue uma linha anteriormente caracterizada como cepalista ou nacional-desenvolvimentista. Seu mestre e guru sempre foi Celso Furtado. Era também caracterizada como estruturalista em contraposição aos monetaristas. Esses viraram néo-liberais e por passarem ser dominantes, se tornaram ortodoxos e os contrários caracterizados como heterodoxos. A dominação monetarista ou neo-liberal desde 1964, com o golpe militar, derrotando o nacional-desenvolvimentismo, faz com que os defensores deste sejam caracterizados como retrógrados ou defensores do retrocesso.

O nacional-desenvolvimentismo acredita na dinamização da economia através da ação direta ou promotora do Estado. Até 1963 a atuação do setor privado era bem menor, do que hoje, dentro do PIB. Não havia grandes empresas industriais ou financeiras e essas eram fortemente dependentes do Estado. O setor público puxava o crescimento econômico. Mas o fez gastando mais do que arrecadava, cobria as contas com a emissão de moeda, o que gerava a inflação. Proibida a emissão, dentro dos conceitos neo-liberais passou a fazer  grandes dívidas, interna e externa, o que levou ao colapso da economia brasileira quando houve o "choque do Petróleo" . Todo seu limite de crédito foi usado para pagar as contas de importação do petróleo. Não conseguindo controlar a economia, os militares saíram do poder. Tentativas populistas foram tendados para controlar a inflação, mas fracassaram.

O controle das contas públicas e contenção da inflação somente foi alcançada cerca de 10 anos após a redemocratização, mediante a aplicação do receituário néo-liberal, recomendado (ou imposto) pelo Consenso de Washington, com inovações e jeitinho brasileiro, mas que deu certo.

Desde o Plano Real o Brasil passou a controlar a inflação e a produzir superávits primários para assegurar o pagamento dos juros e até mesmo amortizar parcelas do principal.

Superavit primário não é uma categoria oficial das contas públicas. Não faz parte da lei 4.320/64 que regulou a contabilidade pública, começando pelas contas orçamentárias. É uma invenção imposta pelo Consenso de Washington, para assegurar o pagamento dos juros da dívida externa.


Mesmo com a eleição de Lula, os mecanismos básicos neo-liberais foram mantidos, por total pragmatismo, e só passou a ocorrer uma mudança de rumo, na segunda parte do primeiro mandato da sua sucessora, mascarada pelas "pedaladas" contábeis. Dilma não conteve os gastos e mascarou os resultados de 2012 e 2013. Só consegui esconder a real situação até o final de outubro de 2014, em função das eleições. Terminada as eleições a situação real foi revelada. E para não incorrer em crime de responsabilidade fiscal, encaminhou um projeto para mudar a LDO.

A consequência real foi a perda de credibilidade do Governo junto ao setor privado produtivo e aos investidores, agravando a desaceleração da economia. Houve uma redução dos investimentos e depois a contenção da própria produção, diante do arrefecimento do consumo interno e das incertezas em relação ao futuro.

Para manter despesas governamentais, principalmente as sociais, Dilma precisa do crescimento econômico privado para gerar mais receita. Paradoxalmente precisa reduzir o Estado para poder sustentar os programas prioritários. 


Para conquistar a confiança do setor privado, aceitou fazer concessões, convidando líderes setoriais tanto para os Ministérios da Agricultura como da Indústria, embora nomes sem unanimidade. E para a Fazenda, a conselho de Lula tentou inicialmente um líder banqueiro, o que não conseguiu,  mas desembocou numa solução técnica melhor. Convidou e teve aceito para o Ministério da Fazenda o melhor "tesoureiro" público (como derivado de tesoura), disponível no mercado. Com uma formação no principal marco da formação neo-liberal, a Escola de Chicago, ampla experiência no gerenciamento de contas públicas, tanto no nível federal, como no estadual, Joaquim Levy está assumindo como uma missão para "passar para a história". Racionalizando, intimamente, que tem obrigação de ajudar a "salvar o país".

Tem plenas condições para conseguir, mas não vai durar, como não durou em cargos anteriores no setor público, incluindo organizações internacionais.

Dilma, com a escolha desse trio, não estaria mudando de convicções ou mesmo de rumos. Apenas estaria fazendo um contorno para mais à frente voltar ao seu rumo estrutural. O seu norte continua o mesmo: "um Brasil socialmente justo, sem miséria e com menos desigualdade social". 

Os fins justificam os meios: até mesmo colocar um superortodoxo no Ministério da Fazenda. 

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