terça-feira, 28 de outubro de 2014

A crise prenunciada

Dilma conseguiu ser reeleita, mas a um custo muito elevado que ela terá dificuldade de pagar.

O primeiro dado a considerar é que ela foi eleita com os votos da opinião não publicada, que praticamente só se manifesta durante a safra (os dias da votação) e não se manifesta durante a entressafra, ou seja, todos os demais dias.

Na entressafra a política é dominada pelos meios políticos Congresso, Assembleias Legislativas, Governantes e manifestações públicas urbanas.

Registramos aqui, na ocasião,  que as manifestações de junho de 2013 foram da opinião publicada e não haviam chegado à opinião não publicada, razão pela qual os políticos ficaram inicialmente assustados, mas se acomodaram quando, voltando às suas bases, perceberam a não contaminação pelas reivindicações de mudanças dos jovens urbanos de classe média tradicional, com alguma adesão da emergente.

Diversamente do que queriam os arautos da opinião publicada, as manifestações de junho de 2013 não refletiam o conjunto da sociedade brasileira, mas apenas um segmento mais visível dela. 

A maioria da opinião não publicada voltou pela continuidade, pela manutenção dos benefícios obtidos e não pela mudança. Até a campanha do PT associou, maldosamente a mudança à perda do bolsa família e de outros benefícios, assegurando a vitória de Dilma. Marina apareceu como alternativa de mudança sem perda dos benefícios obtidos, dai a sua votação no Nordeste que não transferiu para Aécio, percebido como um "riquinho" que não daria a devida atenção aos pobres. Dilma também é uma "riquinha", mas tinha o aval de Lula.

A opinião não publicada se recolhe, não conta com lideranças capazes de mobilizá-la, com poucas exceções e que não são congressistas. São lideranças de movimentos sociais, financiados pelo Governo. Durante a entressafra a única voz em sua defesa é o próprio Governo, mas que também não tem condições de levá-los às ruas, em grandes multidões. Até porque uma grande parte está dispersa em pequenos municípios longínquos  dos grandes centros.

A Presidente, terá que conviver com a opinião publicada, junto à qual ela perdeu as eleições, com grande diferença em relação a Aécio Neves. E o PT está sem grandes lideranças representativas dessa minoria urbana.

O seu principal inimigo não é o PSDB e companhia, que seriam os seus adversários. O inimigo mora junto e está ressentido. O PMDB vai continuar na base aliada, até porque já não sabe mais ser oposição. Desde a redemocratização, sempre foi Governo. Seu único momento de quase oposição foi o breve mandato de Collor. 

O PMDB sentiu-se traido por Lula e pelo PT em eleições estaduais. O mais ressentido é o ainda Presidente da Câmara Federal, que depois de 11 mandados consecutivos, 44 anos dentro do Congresso não voltará àquela e ficará sem mandato legislativo. Mas encontrará um espaço dentro da direção partidária. 

O PMDB não irá abrir mão dos cargos diretivos a que tem direito pelas regras vigentes no Congresso. Não entregará a Presidência da Câmara ou do Senado ao PT como este deseja. E não será inteiramente cordato ao Planalto. Isso pode significar que não irá postergar ou evitar CPIs e outras investigações indesejadas pelo PT. Tenderá, no entanto, a fazer para proteger os seus. Alguns deles tão ou mais comprometidos do que os do PT. 

Os políticos não estarão voltados para a opinião não publicada, ainda que eleitos por ela. Todos estarão preocupados com a opinião publicada, seja nacional, como regional.

Dilma ganhou, democraticamente, a eleição nacional. Mas no meio político que ela irá enfrentar, certamente ela perdeu. O que é prenúncio de crises políticas. 

Não adianta ficar ela e todos os demais com a visão otimista de que não vai acontecer. Por que não queremos que aconteça. 

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